domingo, 14 de setembro de 2014

Sobre o Seminário de Diamantina (2)

Na última quarta, 10/09, fui convidado para participar da gravação do programa Dois Pontos, da TV UFMG, sobre o próximo Seminário sobre a Economia Mineira.

Não é todo dia que a gente pode falar daquilo que gosta e, menos ainda, em companhia de uma amigo como João Antonio de Paula. Coordenador da 16ª edição do Seminário, João Antonio tem sido, desde o início, fundamental para fazer do Seminário de Diamantina o evento bem sucedido que ele se tornou.

O vídeo do programa está publicado no You Tube e pode ser conferido abaixo.


terça-feira, 9 de setembro de 2014

Sobre o Seminário de Diamantina

O texto abaixo foi escrito para a edição n° 1875 do Boletim UFMG:


Era 1982 e vivíamos os últimos anos do regime militar. A economia passava por uma crise acentuada: inflação em alta, dívida externa em crescimento, desemprego elevado e o país a caminho da recessão. O movimento pelas Diretas Já ainda não tinha ganhado força, mas havia a expectativa das primeiras eleições para os governos estaduais desde os anos 1960, que acabariam selando a vitória da oposição em boa parte dos estados. Foi nesse contexto que um grupo de professores do Cedeplar decidiu organizar um seminário para discutir a situação e as perspectivas da economia de Minas Gerais. Estava criado o Seminário sobre a Economia Mineira.

Algumas decisões tomadas naquele momento foram decisivas para assegurar o sucesso do evento ao longo dos 32 anos que se seguiram à sua criação. A primeira foi a ideia de realizá-lo fora de Belo Horizonte, na cidade histórica de Diamantina, que recebeu todas as 15 edições do Seminário. Se a intenção era garantir certa distância da rotina e das demandas cotidianas e tranquilidade para refletir em tempo integral sobre a realidade mineira e seu lugar no contexto nacional, o fato é que a escolha de Diamantina acabou marcando de forma duradoura o espírito do evento.

Não por acaso, ele é mais conhecido como Seminário de Diamantina. A história agitada daquela cidade, seu cenário natural e sua arquitetura colonial, a riqueza de sua tradição cultural na música e na literatura, a hospitalidade e simpatia de sua gente, tudo contribuiu para assegurar o sucesso dos eventos e para nos fazer lembrar que pensar sobre Minas era também um modo de debater sobre as questões mais amplas do nosso tempo, sobre o desenvolvimento nacional e a superação do atraso, sobre a emancipação humana e a construção de uma sociedade democrática e solidária.

A segunda decisão que marcou a trajetória do Seminário foi a de dar ao evento uma natureza multi e interdisciplinar, recebendo trabalhos de economia, demografia e história, que à época correspondiam aos temas que dominavam a agenda de trabalho dos professores do Cedeplar. De lá para cá, essa abertura se acentuou, e o Seminário acolheu textos propostos por arquitetos, geógrafos, cientistas políticos e sociólogos, abrindo-se também à discussão de temas como o meio ambiente e as cidades, que convidam justamente à busca de uma perspectiva que não seja meramente disciplinar ou segmentada.
Em terceiro lugar, sem trair o compromisso com o rigor e a crítica que são próprios da reflexão acadêmica, o contexto das mudanças políticas em curso naquele ano de 1982 contribuiu para que o Seminário recebesse um público mais amplo que o estritamente universitário – empresários, sindicalistas, quadros da administração pública, entre outros – e abarcasse a discussão de temas ligados à formulação e avaliação de políticas públicas.

Finalmente, outra marca do evento, presente desde a sua origem, é a capacidade de encarar a discussão sobre a economia e a sociedade mineiras como parte de uma reflexão mais ampla sobre a cultura, sobre os valores e os modos de expressarmos nossas inquietações, engenho e criatividade. Os debates com compositores, poetas, prosadores e críticos, as apresentações teatrais e musicais, as exposições e diferentes expressões culturais foram presença constante e ponto alto das programações. Para os que estiveram lá, como eu, é emocionante lembrar o que sentimos no show de comemoração dos 40 anos do Clube da Esquina, em 2012, assim como é impossível esquecer o fascínio provocado por Francisco Iglésias, Antonio Candido, Fernando Brant, Affonso Romano de Sant’Anna, Otávio Dulci e Vera Alice Cardoso, que, na mesa de encerramento do primeiro Seminário, em 1982, discutiram as muitas Minas, prendendo a atenção de todos até às 23 horas!

Eu era aluno de graduação da Face e estava presente naquela noite memorável. Desde então, participei de boa parte dos Seminários de Diamantina. Não é exagero afirmar que minha trajetória acadêmica – e a de muitos docentes que hoje estão à frente do Cedeplar e da Faculdade de Ciências Econômicas – se confunde, de algum modo, com a do próprio Seminário. A cada dois anos em que ele se realiza, temos observado os resultados de nosso trabalho, refletidos nos textos que apresentamos e na produção dos nossos alunos de graduação e pós-graduação. Mais do que isso, os seminários têm sido um momento para ensaiar novas questões, para avaliar o que foi feito e buscar os temas que irão povoar nossa agenda de pesquisas. Numa palavra, os Seminários de Diamantina têm-se constituído em momento de compreender e avaliar o sentido do trabalho que fazemos, de buscar novos rumos e repactuar os valores acadêmicos que nos são caros.

Quero acreditar que isso valha também para as centenas de participantes do Seminário provenientes de outras unidades da UFMG, de outras instituições universitárias e de pesquisa, de órgãos e agências governamentais, ONGs e outros. Se em algum momento fez sentido pensar no Seminário de Diamantina como atividade do Cedeplar ou da UFMG, é claro que seu crescimento e diversificação tornaram-no muito maior do que as instituições que deram origem a ele. É bom que seja assim, que ele cumpra cada vez mais o papel de aglutinar e criar laços de cooperação acadêmica entre pessoas de diversas regiões e formações, sem esquecer as amizades e afetos criados nas salas, ruas, auditórios e bares de Diamantina.

Concluo prestando minha homenagem aos que criaram o Seminário e a todos que, nas últimas três décadas, contribuíram para que ele se realizasse. Somos gratos pelo que fizeram e pelo rumo que imprimiram ao evento. Neste setembro de 2014, em que vamos realizar a 16ª edição do Seminário, esperamos que ele seja capaz de se renovar e de dar início a uma “vida nova”.


quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Sobre a edição crítica das obras de Marx e Engels

É difícil pensar em algum outro autor que tenha sido tão influente no mundo contemporâneo quanto Karl Marx. No último século e meio que nos separam da publicação do primeiro livro de O Capital, as obras de Marx foram lidas não apenas por pesquisadores e estudiosos, mas também por militantes políticos e curiosos das mais diferentes partes do globo.

Por outro lado, a recepção das ideias de Marx comporta numerosos problemas e, até mesmo, paradoxos. Nos países em que foi venerado, suas ideias foram simplificadas e distorcidas, apresentadas como uma doutrina monolítica que proporcionaria justificativas para as práticas políticas de regimes francamente autoritários. Em toda parte, seguidores e adversários de Marx estabeleceram uma continuidade direta e estrita entre suas ideias e aquelas que povoaram o marxismo em suas mais diferentes versões. As diferenças que poderiam existir – e certamente existem – entre os conceitos marxianos e as ideias marxistas foram esquecidas ou apagadas.

De fato, as dificuldades envolvidas na recepção das ideias de Marx só podem ser bem entendidas se atentarmos para o fato de que  o marxismo se desenvolveu numa época em que o conhecimento dos
escritos de Marx era repleto de lacunas e, por isso mesmo, parcial e inadequado. A doutrina do “materialismo histórico”, por exemplo, foi formulada nas últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século XX por autores como Plekhanov, Mehring e Kautsky, muito antes que o manuscrito de A Ideologia Alemã fosse publicado. E, mais decisivo, essa doutrina acabou influenciando a maneira como o manuscrito foi lido e interpretado. Também não foi por acaso que a publicação tardia de obras como os Manuscritos Econômico-Filosóficos e os Grundrisse der Kritik der politischen Ökonomie provocasse o surgimento de longas controvérsias e críticas às interpretações convencionais da crítica da economia política.

Por essa razão – pelo fato de que o marxismo se constituiu antes mesmo que a maioria dos textos de Marx fosse conhecida – compreender a recepção da obra de Marx e as interpretações que foram dadas a suas ideias requer que um entendimento seguro do movimento de edição e publicação de cada um de seus textos. Além disso, conhecer o modo como as obras de Marx vieram a público e o contexto em que foram lidas pode contribuir para uma releitura desses textos em nova chave, para a reinterpretação do pensamento de Marx agora livre das funções ideológicas que pesaram sobre ele no passado.

É o que procuramos mostrar num artigo que acaba de ser publicado na série de Textos para Discussão do Cedeplar-UFMG:
Cerqueira, Hugo. Da MEGA à MEGA2: breve história da edição crítica das obras de Karl Marx, (Textos para Discussão, n° 506), Cedeplar-UFMG, 2014.

O artigo pode ser baixado da base bibliográfica EconPapers: basta clicar no link acima e, em seguida, no link em "Downloads: (external link)". O texto apresenta as principais tentativas de empreender uma edição completa e histórico-crítica das obras de Karl Marx, a Marx-Engels Gesamtausgabe (MEGA): a primeira, liderada por David Riazanov nos anos 1920-30 e, a segunda, o projeto da MEGA2, iniciado nos anos 1970 e ainda em curso. Além de apresentar essas duas edições, o texto discute seus impactos sobre a interpretação do pensamento econômico e filosófico de Marx tomando como exemplo as discussões recentes sobre duas das obras consagradas de Marx: a Ideologia Alemã e O Capital.

Espero que a leitura seja proveitosa. Comentários e críticas são benvindos.


domingo, 13 de julho de 2014

A História do Pensamento Econômico, de Isaac Rubin

A tradução da História do Pensamento Econômico
lançada no Brasil.
Recebi nessa semana um dos lançamentos mais aguardados desse ano, a tradução de História do Pensamento Econômico, de Isaac Rubin. O livro acaba de ser lançado pela Editora da UFRJ, numa edição elegante e bem cuidada. A tradução foi feita por Rubens Enderle a partir de versão inglesa de Donald Filtzer, e contou com a revisão técnica de Maria Malta e Rodrigo Castelo. 

Como expliquei em um post anterior, tive a honra de ser convidado para escrever, juntamente com o meu amigo João Antonio de Paula, a apresentação do volume. A íntegra dessa apresentação pode ser baixada no Econpapers

O livro já está chegando às livrarias, mas será lançado oficialmente no dia 13 de agosto, numa mesa redonda na UFRJ.



Complemento em 13/09/14

A Editora UFRJ preparou um vídeo sobre o lançamento do livro, com um pequeno depoimento meu e da minha colega, Profa. Maria Malta. Ele pode ser conferido abaixo:





sexta-feira, 6 de junho de 2014

domingo, 25 de maio de 2014

Os melhores romances policiais de 2013

O ano já vai quase pela metade e ainda não publiquei minha lista dos melhores romances policiais de 2013 (consulte a lista dos melhores em 2012 e 2011). Para não quebrar a série e evitar mais demoras, vou me limitar a indicar os livros, sem maiores comentários.  Antes disso, faço dois avisos importantes.

O primeiro, é que a lista reúne os melhores policiais entre os que pude ler em 2013. Alguns foram lançados ainda em 2012. Por outro lado, alguns lançamentos de 2013 podem ter passado desapercebidos.

O segundo aviso é que não costumo incluir autores que considero bons demais pra tomarem parte em qualquer lista sob o risco de não deixarem espaço pra mais ninguém. É o caso de um Simenon, por exemplo, de quem continuo lendo os volumes relançados pela L&PM.

Na mesma linha, tomei a decisão de não incluir O homem que amava os cachorros, do cubano Leonardo Padura. Apesar de ser um autor consagrado de romances policiais, o livro não se encaixa exatamente no gênero. Além disso, ele não está apenas entre os melhores policiais lançados em 2013, mas foi o melhor romance que li no último ano. Fica, portanto, como uma recomendação à parte.

Dito isso, aqui está a minha lista dos melhores policiais de 2013. São os seguintes:

Morte em Pemberley, de P. D. James.
Tradução de Sonia Moreira.
Cia das Letras, 2013.



 





Boneco de Neve, de Jo Nesbo.
Tradução de Grete Skevik.
Record, 2013.









O Exército Furioso, de Fred Vargas.
Tradução de Dorothée de Bruchard.
Cia das Letras, 2012.









O Segredo do Lago, de Arnaldur Indridason.
Tradução de Álvaro Hattnher.
Cia das Letras, 2013.









O Clube Dante, de Mathew Pearl.
Tradução de Maria José Silveira.
Record, 2012.




terça-feira, 6 de maio de 2014

sábado, 15 de março de 2014

Sobre a estrutura lógica do conceito de capital

Sobre a estrutura lógica do conceito de capital em Karl Marx (Zur logischen Struktur des Kapitalbegriffs bei Karl Marx), de Helmut Reichelt, é um dos textos fundadores e mais importantes da chamada Neue Marx-Lektüre, a interpretação da obra de Marx desenvolvida por um grupo de autores alemães nos anos 1970 e 1980, inspirados pelos trabalhos de Pashukanis e Rubin.


http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/externo/index.asp?id_link=3960&tipo=25&nitem=42160968
Nascido em 1939, Reichelt foi aluno da Universidade de Frankfurt onde, em 1968, apresentou uma dissertação escrita sob a orientação de Theodor W. Adorno, que continha a primeira versão daquele texto. Sua publicação em livro ocorreu alguns anos mais tarde, em 1973, com uma apresentação escrita por Iring Fetscher.

Desde essa época, Reichelt desenvolveu uma estreita colaboração com Hans-Georg Backhaus, outro expoente daquele grupo de intérpretes de Marx. Orientados pelos desenvolvimentos da teoria crítica de Adorno e Horkheimer, eles se engajaram numa discussão de temas econômicos e, em particular, da teoria do valor de Marx e sua relação com a dialética hegeliana.

Passados 40 anos de sua publicação original,  Sobre a estrutura lógica do conceito de capital em Karl Marx foi finalmente traduzido para o português por Nélio  Schneider e lançado pela Editora da Unicamp. Praticamente desconhecido pelos brasileiros, o lançamento do livro foi tão pouco divulgado que ele corre o risco de continuar ignorado, o que seria lastimável. Fica feito, então, esse registro.

PS.: a revista Crítica Marxista publicou em seu número 33 a tradução de outro texto de Reichelt: "Que método Marx ocultou?". Trata-se de um capítulo do livro Neue Marx-Lektüre: Zur Kritik sozialwissenschaftlicher Logik, lançado originalmente em 2008. O texto pode ser baixado gratuitamente no site da revista.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

João Batista Libânio (1932-2014)

Desde os meus tempos de Colégio, as grandes lideranças intelectuais dos jesuítas no Brasil foram o Padre Vaz, na filosofia, e o Padre Libânio, na teologia. Eles formaram uma dupla admirável pelo sentido e estatura de seus trabalhos, que propunham uma reflexão original e rigorosa, atualizada com o que havia de mais importante em suas áreas. Escreviam textos claros e diretos, ainda quando o assunto fosse complexo e difícil. Aprendi um bocado com os dois.

Mais tarde, tive a chance de ser aluno do Pe. Vaz na UFMG. Apesar de morar em BH e de ser tio de um velho amigo de colégio, não conheci pessoalmente o Pe. Libânio. Ele faleceu hoje, aos 81 anos. Vai fazer falta.

http://tinyurl.com/pu8wpnt