Rosa: 'Liberdade é sempre a liberdade daquele que pensa de modo diferente'. |
Dias atrás, passeando por uma de minhas livrarias preferidas, deparei com três volumes em capa bege contendo uma coletânea de textos políticos e cartas de Rosa Luxemburgo. Os livros, lançados recentemente pela Editora da Unesp, foram organizados por Isabel Loureiro, que além de ser uma das grandes estudiosas da obra de Rosa, vem cumprindo um papel importante na divulgação de suas ideias no Brasil, dando continuidade ao esforço pioneiro, iniciado no pós-Guerra, pelo grande Mário Pedrosa, e seguido por Paulo Singer, Maurício Tragtenberg, Michael Löwy e outros tantos.
O volume I cobre o período que vai de 1899 até julho de 1914, início da I Grande Guerra. Começa por "Reforma social ou revolução?", famosa investida crítica ao revisionismo de Bernstein, passando por "Questões de organização da social-democracia russa", de 1904, em que Rosa formula uma crítica aguda à concepção leninista de partido, que culminaria em sua famosa (e profética) crítica ao comportamento autoritário dos bolcheviques no poder, em "A Revolução Russa", que é de 1918.
Este último texto, integra o segundo volume da coletânea. Rosa se insurge ali contra a supressão das liberdades democráticas pelos bolcheviques, liberdades que são essenciais, em sua opinião, para o aprendizado político das massas, para o acúmulo de experiências políticas que é requisito para a afirmação do socialismo. Um socialismo que, logo se vê, não pode ser criado por decreto, mas pela auto-determinação das massas educadas e formadas na experência da liberdade.
"Hoje encontramo-nos, extatamente como Friedrich Engels previu há uma geração, 40 anos atrás, perante a escolha: ou o triunfo do imperialismo e decadência de toda a civilização, como na antiga Roma, despovoamento, desolação, degeneração, um grande cemintério; ou vitória do socialismo, isto é, da ação combativa consciente do proletariado internacional contra o imperialismo e seu método, a guerra. Esse é um dilema da história mundial, uma coisa ou outra, uma balança cujos pratos oscilam e tremem perante a decisão do proletariado com consciência de classe" (p. 29).Ainda que se possa discutir o significado preciso da expressão "barbárie" nessa fórmula, o fato é que, como Löwy apontou num dos capítulos de seu Método dialético e teoria política, ela nos coloca diante de uma concepção de história nova, anti-determinista, em que o curso dos acontecimentos não pode ser estabelecido previamente com base em "leis objetivas" mas, ao contrário, a subjetividade joga um papel decisivo na determinação dos rumos que serão seguidos. História como processo aberto, sujeita ao progresso que, entretanto, não é inevitável.
Com o lançamento desses três volumes, reunindo uma coleção abrangente de textos em tradução e edição bem cuidadas, os brasileiros podem se orgulhar de comemorar à altura e com muito estilo os 140 anos dessa figura fascinante que foi Rosa. A professora Isabel Loureiro e sua equipe estão de parabéns pelo trabalho, que irá contribuir imensamente para a difusão das ideias de Rosa Luxemburgo entre os leitores de língua portuguesa. Nada mais oportuno num momento como esse em que vivemos, em que sua reflexão e exemplo ganham tanta atualidade.
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PS. Os volumes dessa coleção podem ser encontrados em diversas livrarias. Aquela que mencionei no início do texto e onde me deparei com eles pela primeira vez é a Canto do Livro, que fica aqui em Belo Horizonte e que eu frequento há um bom tempo. Não se trata de fazer propaganda mas, nestes tempos de livrarias virtuais (que são muito boas), é preciso valorizar quem consegue manter um bom estoque de livros à disposição de leitores incautos.
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