A coleção já publicou obras de autores conhecidos da maioria dos economistas ou mesmo do público letrado, como Adam Smith, Benjamin Franklin, David Ricardo, Cantillon e Simonde de Sismondi. Publicou também autores sobre os quais poucos leitores fora do círculo dos especialistas ouviram falar, como Geminiano Montanari, Ferdinando Galiani ou Antonio Serra.
Isaac de Pinto integra esse último grupo. Nasceu em Amsterdã, em 1717, numa família de judeus de origem portuguesa, ligados ao comércio e às finanças. Seu pai, David Pinto, foi um dos mais ricos membros da comunidade sefardita de Amsterdã na primeira metade do século XVIII. Isaac seguiu os passos do pai, tornando-se acionista e diretor da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, bem como da Companhia Holandesa das Índias Orientais, e uma das figuras mais importantes da vida política e financeira em Amsterdã. Em 1759, em meio a Guerra dos Sete Anos, levantou um empréstimo de seis milhões e seiscentas mil libras para o governo inglês, valor que montava a quase 1/4 do total da dívida pública daquele país.
Frontispício da primeira edição (1771) do Tratado da Circulação e do Crédito. |
A partir de então, seus negócios sofreram reveses que levaram a uma mudança de rumos em sua vida: mudou-se para Paris e deu início a composição de um conjunto variado de textos, que incluíram um tratado sobre questões monetárias, cujo manuscrito fez circular entre diferentes leitores, entre os quais, David Hume. Apesar de divergirem acentuadamente a respeito das questões relacionadas ao endividamento público, Hume o encorajou a publicar a obra. A edição original, com o título de Traité de la circulation et du crédit, apareceu em 1771 (e não em 1770, como sugere a tradução brasileira recém lançada). Três anos depois, uma versão em inglês foi publicada com o título de An Essay on Circulation and Credit in Four Parts. Apesar disso, o livro teve escassa circulação e repercussão.
O Tratado abordava um conjunto variado de temas: a liberdade de comércio, a circulação monetária, o consumo de supérfluos, o sistema tributário e o endividamento público. Ao tratar de cada desses assuntos, Isaac de Pinto não hesitou em confrontar as visões estabelecidas por alguns dos expoentes do Iluminismo, como Voltaire, Mirabeau e Hume. Seus argumentos, apesar de originais, não foram suficientes para estabelecer sua reputação entre os analistas econômicos da época. De todo modo, a leitura do Tratado segue sendo esclarecedora do contexto e dos debates que deram origem à economia política como campo disciplinar. Para quem quiser se aprofundar na compreensão da obra, há um bom comentário escrito por José Luís Cardoso e António de Vasconcelos Nogueira, dois estudiosos portugueses.
Registro aqui meu reconhecimento e gratidão à pequena editora Segesta e ao seu proprietário e editor, Andrea Vicentini, pelo lançamento de mais essa tradução. Ninguém deve se enganar quanto a natureza do trabalho que ele vem desenvolvendo à frente da coleção Raízes do Pensamento Econômico. Andrea e sua Segesta não escolheram publicar traduções de livros antigos, de autores quase obscuros, com a expectativa de obter alguma vantagem pessoal ou lucro. Tanto assim que, além das cópias impressas que vende diretamente por meio de seu site, os volumes lançados pela editora estão igualmente disponíveis em meio eletrônico aos interessados, sem qualquer custo. Trata-se, é claro, de um trabalho movido por generosidade e paixão, que só o tornam ainda mais especial e merecedor de nosso agradecimento e simpatia. Parabéns, Andrea!
Andrea Vicentini, editor da Segesta (foto publicada no jornal Valor, em 03/09/12). |